Sou Haiti.

quarta-feira, 7 de maio de 2008

Assim...

Segundo Carl Gustav Carus, a humanidade divide-se em povos do dia (caucasianos), do crepúsculo oriental (mongóis, malaios, hindus, turcos e eslavos), do crepúsculo ocidental (índios americanos) e povos da noite (africanos e australianos). Para ele o progresso segue do Leste para o Oeste.
E assim seguem relatos e mais relatos sobre os mistérios selvagens da África negra.
O tratamento dos europeus para com os africanos diferencia-se do oferecido aos índios da América que, apesar de serem vistos como primitivos, eram dotados de pureza, algo que não se aplicava aos negros. A cor que os distinguia dos brancos era estranha e pedia explicação. Teriam os negros a pele escura devido à forte influência do sol nas regiões por eles habitadas? Seriam os negros tão escuros por sua descendência de Caim, que teve sua face enegrecida por Deus após matar Abel? Ou pela maldição de Noé sobre Caim do qual todos os negros descenderiam? Seriam negros por causa da água e dos alimentos que os nutria, encontrado somente na África?
A África seria uma terra de pecado e imoralidade, gerando homens corrompidos; povos de clima tórridos com sangue quente e paixões anormais que só sabem fornicar e beber.
A religião africana também é condenada. Para o autor a maioria dos escravos nasce, vive e morre sem ter nenhum contato com o divino.
Como pode tal homem, que prefere o vício à liberdade, servir ao progresso da nação?

Ô Brasil.

O interesse de parte da elite intelectual brasileira pelos movimentos para a emancipação dos escravos no Brasil obedeceu, desde seu inicio, a uma lógica que unifica seus pensamentos aos ideais do Iluminismo/Liberalismo europeu. Em nome da igualdade de direitos, da liberdade, da economia liberal, muitos pensadores condenaram o sistema colonial e o trabalho escravo buscando igualar o país às mais desenvolvidas nações da Europa. No texto que será analisado a seguir fazem-se presentes teses como: todo homem é proprietário de si mesmo; a liberdade é um bem inalienável; não pode haver nação onde não há igualdade de direitos, preocupação com o bem-estar de seu povo e aprimoramento dos meios de produção e dos produtores. Também faz parte dele (de modo explícito ou não) o desprezo pelo trabalhador negro e mestiço.
E assim caminhamos... “Democracia racial”, luta por igualdade e tal. Estamos aqui. Disfarçados, misturados, miscigenados, afastados, abraçados.

É Haiti.

No início do século XIX, o Haiti era a colônia mais produtiva das Américas e a primeira a conquistar a Independência nacional, em 1804. Mas quê?!!!!
Os ecos da Revolução Francesa se fizeram presente no Haiti, (os mesmos ecos que surgiram aqui e forçaram nossa princesinha) surgia a figura de Toussaint L’Ouverture, escravo que teve acesso a educação, tornando-se líder dessa revolução. A história do Haiti nos emociona, vamos lendo sobre esse levante, sobre as estratégias de Toussaint, vendo seus erros, mas que no final se mostram graves demais, como a reinserção do escravismo em terras haitianas mesmo após a revolução. Mas isto ainda não seria o pivô para a miséria desta nação. A exclusão do Haiti por Simon das nações latino-americanas convidadas para a Conferência do Panamá, em 1826 provocou danos irreversíveis a esta nação irmã. Só de observar que os EUA dominam 89% das importações e 65% das exportações desta nação não nos resta duvida de que estes danos ainda permanecem.

Irmã, por quê?

Filhos da mesma África, dos mesmos preconceitos, da mesma exploração. Nativos dizimados, cultura deturpada. Danos irreversíveis. A religião Vodu ainda é estigmatizada no Haiti, e no Brasil, como fica a Umbanda, Candomblé e afins? O catolicismo, que até pouco tempo atrás era a única aceita oficialmente no Haiti era pratica em conjunto com o espiritismo Vodu. E no Brasil, católicos, luteranos, muitos não teriam certa mística afro? E a miséria? Nos suburbanos (maioria negra) a miséria e pobreza imperam não muito diferentes do Haiti. O Haiti é aqui, a miséria é aqui!
Santos. Gislene Aparecida. A invenção do Ser Negro. RJ: EDUC-FAPESP-PALLAS, 2002.
Sansone, Livio. Negritude sem Etnicidade. Salvador/RJ: EDUFBA-PALLAS, 2004.
Maestri, Mário. A Servidão Negra. Porto Alegre: Mercado Aberto., 1988.
Gorender, Jacob. O épico e o trágico na história do Haiti. Estudos Avançados 18 (50), 2004.

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