quarta-feira, 1 de outubro de 2008
Tomemos os seis dias da semana para representar o que de fato se passou em cinco bilhões de anos. O nosso planeta nasceu numa segunda-feira, a zero hora. A Terra formou-se na segunda, terça e quarta-feira até o meio-dia. A vida começa quarta-feira ao meio-dia e desenvolve-se em toda sua beleza orgânica durante os quatro dias seguintes. Somente às quatro da tarde de domingo é que os grandes répteis aparecem. Cinco horas mais tarde, às nove da noite, quando as sequóias brotam da terra, os grandes répteis desaparecem. O homem surge só três minutos antes da meia-noite de domingo. A um quarto de segundo antes da meia-noite, Cristo nasce. A um quadragésimo de segundo antes da meia-noite iniciasse a Revolução Industrial. Agora é meia-noite de domingo e estamos rodeados por pessoas que acreditam que aquilo que fazem há um quadragésimo de segundo pode durar indefinidamente. (David Brower, ecologista americano)
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Passei hoje de manhã pelo Luz de Luma e encontrei esta blogagem coletiva que gostei muito. A Luma fez um post muito interessante, vale a pena conferir... Vou publicar parte de um texto que li e achei muito interessante, muito mesmo! Não sou da área de biologia, mas eu gostei da abordagem filosófica que aponta para muitos caminhos educacionais... O trecho que selecionei aborda o conceito grego de Physis e como ele é importante para resgatarmos uma visão holística da natureza. Assim como nos impulsiona para refletirmos sobre nossa condição neste universo, assim como provocou o ecologista David Brower na citação de abertura deste post. Eu li alguns artigos e muitos apontavam para a Ecopedagogia e para a Educação Ambiental. Acredito que estes são os melhores caminhos para mudarmos e implementarmos uma cultura que respeite e integre melhor o ser humano com a natureza.
Carvalho, Isabel Cristina de Moura.
Em direção ao mundo da vida : interdisciplinaridade e educação ambiental / Conceitos para se fazer educação ambiental / Isabel Cristina de Moura Carvalho. — Brasília : IPÊ - Instituto de Pesquisas Ecológicas, 1998.
Entre a máquina e a mística da natureza
A ecologia tem seu nascimento “oficial” em 1866, quando, pela primeira vez, o biólogo alemão Ernest Haeckel, importante difusor das idéias de Charles Darwin, usa o conceito ecologia na literatura científica ao afirmar: “Por ecologia, entendemos a ciência das relações dos organismos com o mundo exterior”. Este conceito foi se tornando complexo, ao longo do tempo, sem perder o seu sentido original.
Hoje, de modo geral, entende-se por ecologia o estudo das relações que os seres vivos mantêm entre si e o meio ambiente. Formada pela reunião das palavras gregas logos (que significa estudo) e oikos (que significa morada, casa), a ecologia nomeia o estudo do lugar que os seres habitam, também chamado pela ciência de ecossistema. Essa casa comum dos seres vivos compreende tanto as relações que compõem um ecossistema específico como também pode abranger muitas outras inter-relações entre os ecossistemas que constituem o planeta Terra. Por isso, encontraremos tantos estudos ecológicos voltados para ecossistemas específicos (como os ecossistemas marinhos, por exemplo) quanto outros que discutem as inter-relações abrangentes entre vários ecossistemas e o conjunto do planeta. Mais recentemente, o conceito de ecologia vem se ampliando e já há autores que consideram vários níveis de relações ecológicas, incluindo, além de uma ecologia estritamente ambiental, uma ecologia social e até mesmo uma ecologia mental.
Mas, voltando às origens da ecologia, uma coisa curiosa a respeito de Haeckel é que, além de cientista, ele também era membro influente da Liga Monista. O monismo era a corrente filosófica que postulava uma visão unificada e equilibrada de todo o Universo. Para os monistas, tudo o que existia no mundo era feito da mesma matéria. Portanto, todos os seres vivos tinham o mesmo valor na ordem natural. Além disso, tomavam a natureza como fonte de verdade e modelo para a vida humana.
A ecologia teve, assim, desde seu nascimento, uma marca muito significativa. É fruto de uma visão científica, mas sua orientação sistêmica também não deixa de estar permeada por uma filosofia holística. Esse diferencial talvez seja, em parte, responsável por uma certa permeabilidade da ecologia, que vem sendo associada a outros valores extracientíficos, animados pela idéia de uma “busca da Physis”.
Perspectiva Moderna
O que caracterizou, desde seu início, a perspectiva moderna foi a transformação do mundo em objeto externo de conhecimento. Isso deu lugar a uma operação progressiva de divisão e classificação que se tornou a base do conhecimento científico. Essa racionalidade ordenou o mundo na base de uma série de dualismos, os quais inauguraram as conhecidas polaridades que ainda hoje orientam todo o nosso pensamento: humano x natureza; cultura x biologia; sujeito que conhece x objeto conhecihumano x natureza; cultura x biologia; sujeito que conhece x objeto conhecido, apenas para citar algumas das mais conhecidas.
Com o mundo transformado em objeto, a complexidade do Universo foi traduzida em inúmeros
pedaços, partes, especialidades, disciplinas. Sabemos que a ciência moderna se funda nesse pensar classificatório, descrevendo e estudando aspectos cada vez mais parciais e especializados dos seus objetos de conhecimento.
O teólogo Leonardo Boff, que se dedica a pensar como estas questões acerca do conhecimento
afetam a condição humana, fala sobre a redução do complexo ao simples e ajuda-nos a compreender o reducionismo que está na base do pensamento disciplinar:
Complexidade é uma das características mais visíveis da realidade que nos cerca. Por ela queremos designar os múltiplos fatores, energias, relações que caracterizam cada ser e o conjunto dos seres do universo. A ciência moderna, nascida com Newton, Copérnico e Galileu Galilei, não soube o que fazer da complexidade. A estratégia foi reduzir o complexo ao simples. Por exemplo, ao contemplar a natureza, ao invés de analisar a teia de relações complexas existentes, os cientistas tudo compartimentaram e isolaram. (...)Assim, começaram a estudar só as rochas, ou só as florestas, ou só os animais, ou só os seres humanos. E, nos seres humanos, só as células, só os tecidos, só os órgãos, só os organismos, só os olhos, só o coração, só os ossos, etc. Desse estudo, nasceram os vários saberes particulares e as várias especialidades. Ganhou-se em detalhe, mas perdeu-se a totalidade.*
Mas isso nem sempre foi assim
Essa visão, que hoje nos parece tão “natural”, foi construída no bojo das transformações sociais
e culturais que para alguns autores datam do início do cristianismo, e para outros só se configuraram como um novo paradigma de conhecimento a partir do século XV. O fato é que essa visão moderna, que fragmenta o mundo para compreendê-lo, não faz nenhum sentido, por exemplo, para muitos dos povos indígenas que pensam o Universo de forma mítica. Como também não faria nenhum sentido na Grécia antiga, que não concebia a natureza em oposição aos humanos. Os gregos desse período tinham um nome muito especial para denominar a natureza e todo o Universo que não era pensado como objeto, mas como uma totalidade: Physis.
Physis: a natureza de todas as coisas
Essa palavra representa uma experiência da natureza bem diferente do que podemos perceber por intermédio de suas traduções pelas línguas latinas. Isso porque não temos, em nossa cultura
latina, uma visão de natureza que se aproxime daquela dos gregos. Certas palavras, às vezes, não têm tradução porque simplesmente não existe uma experiência cultural que permita encontrar a idéia equivalente na outra língua. Este é precisamente o caso de Physis.
Physis designava a natureza de todas as coisas que nascem e se desenvolvem sem a assistência dos humanos, isto é, que se desenvolvem por si mesmas, independentemente da vontade humana. Os gregos acreditavam que no Universo havia uma ordem anterior às decisões humanas que a tudo regia. Era uma ordem natural a que tudo, incluindo as pessoas, estava submetido. Essa ordem natural era a morada da imortalidade, daquilo que dura no tempo, que nunca iria perecer, ser esquecido ou destruído. Physis era o mundo imortal, onde se dava a existência mortal dos humanos.
A modernidade e a natureza: a physis silenciada
Imensa mudança de mentalidade marca a passagem da antiguidade greco-romana para a Idade Moderna. Uma noção como a de Physis não encontra lugar dentro da visão de mundo predominante na modernidade. Pode-se dizer que, na modernidade, a Physis grega se silenciou simplesmente porque não se consegue mais pensar nos termos daquela visão grega de mundo.
Mas como foi que isso se deu? Afinal, o que é a natureza para a maioria dos que vivem na modernidade? Em primeiro lugar, aconteceu na modernidade o que alguns autores chamam de “o desencantamento do mundo”, isto é, não há mais espaço para uma idéia como a de Physis. A crença de que o mundo estava animado por uma ordem ou verdade que transcendia a existência humana perdeu força. A Physis foi silenciada, as forças cósmicas e os deuses já não habitam mais a natureza. O domínio da imortalidade e da transcendência, representado na cultura grega pela noção de Physis, começou a abandonar o mundo.
Na modernidade, a percepção predominante é de que tudo tende a se tornar perecível. Parodiando o poema de Vinícius de Moraes, poderíamos dizer que o espírito moderno é aquele que considera que tudo “é infinito enquanto dure”, ou seja, nada mais promete ser eterno ou permanecer para sempre. A sensação de tudo é transitório e perecível. A maioria dos humanos, na modernidade, não se sente mais inserida num cosmos, numa ordem que a ultrapassa. Os humanos modernos tendem a se pensar como fontes de suas próprias leis e, muitas vezes, como autores da ordem do mundo.
Por isso, não há mais uma ordem transcendente a ser contemplada no âmago da natureza. Os cientistas modernos não estão em busca da revelação do espírito das coisas. Eles procuram por propostas provisórias, posteriormente refutadas ou conservadas. Ao invés da contemplação filosófica, o cientista moderno busca respostas práticas nos experimentos com a natureza. O que a ciência moderna com sua lógica disciplinar, silenciou foi a dimensão do mistério.
*Leonardo Boff, A águia e a galinha; uma metáfora da condição humana, Petrópolis, Vozes, 1997, p. 72.
Acredito que esta concepção de physis também era presente na formação do povo de Israel, em sua maioria povos nômades que viviam em busca de melhores locais para se subsistirem, temos várias passagens bíblicas do Antigo Testamento em que reverenciam a natureza, a colocam a importância de se cuidar dela e a vê como sustentanda pelo seu deus. Acredito que isto se dê a sua intimidade com a natureza. Eu convivi por uns anos com colegas estudantes que vieram do meio rural e já neles é possível ver essa relação íntima e de cuidado que de tão forte me causava estranheza. Só com o tempo fui percebendo e compreendendo a importância que havia para alguns em cuidarem de seus jardins e plantas. Para eles era uma questão de necessidade cuidar do meio ambiente. Que possamos sentir esta mesma necessidade e assumirmos senão toda, mas parte da physis como pensamento...
“O Reino de Deus é ver sua criação livre de qualquer mal” (Isaias 65.17-25, Oseias 2.19)
O Caetano-músico compos uma obra-prima para nossa Terra. Vale a pena ouvir essa versão.
13 comentários:
Valendo um picolé pra quem ler o post inteiro(*rs)
Happy Ecological Day!
Paz
Leandro Neves, ótima postagem.
Grande abraço.
Então passa o picolé pra cá porque eu li. Não passo por um blog sem ler. Leio tudo... hoje não tive muito tempo, mas vou pegar meus óculos e volto e vc vai ver. :)
Voltei e agora estou de óculos. Ouvindo Caetano falando que viu a terra da mesma forma que americanos e russos dizem ter visto. Gosto dessa música porque ele cita a Paraíba que é o meu ecossistema agora.
Fui lendo e tanta teoria me diz que é melhor cuidar do jardim antes que tudo se acabe. Assim como um futuro sem água potável. Nas grandes cidades, se tem menor preocupação como essa questão ecológica. Porque prédios não precisam de raízes - eis o pensamento moderno e equivocado. Admito que penso no futuro e imagino a terra seca, sem planta, tudo quanto é tipo de animal em extinção. Até o bicho humano - como já diz o poema de alguém que não lembro - entraria em extinção. Não uso esperança como palavra clichê para dizer que espero e acredito que cuidando de nossas mentes, de nossa casa e de nosso pequeno mundo, poderemos respeitar mais o que nos cerca. Me refiro a todo ecossistema que é feito de bichinhos, plantas, pessoas, religiões, diferenças e ideais.
Eu li. Logo penso. Logo Physis.
Leandro,
Muito obrigada por participar do Ecological Day com um texto denso mas muito elucidativo sobre o conceito de Ecologia e a sua transformação através dos tempos.
Li todo o texto ele sim! (risos) e inclusive vou passar o link para a minha filha que é Ecóloga.
Acho que a música Terra, do Caetano era tocada na abertura do programa Planeta Terra, da TV Cultura, há tempos.
Um grande abraço!
Ops! Errei ao digitar, quis escrever: "Li todo o texto sim!".
Uma blogagem coletiva dessas e eu fora da internet... Pode uma coisa dessas, me diz?? =´(
Adorei o texto, já era de see sperar né? Gosto da forma como Boff vê a ligação do ser humano com as coisas do mundo (não no sentido que algumas pessoas dão a essas palavras, no sentido das coisas primárias que existem no mundo; os seres e seus sistemas), é uma visão bastante oriental a dele, ele flerta bastante com filosofias orientais... E eu adorei sua conclusão... =)
muitos beijos de saudade enorme.
Leandro, o homem precisa sentir que ele faz parte de um ciclo de vida e mais que isso, de uma cadeia inserida dentro do contexto "cosmo". Não posso nem questionar um texto de Leonardo Boff. Obrigada pela generosidade, mesmo achando que muitos possam não ler, ele é mais do que um presente! Bom fim de semana! Beijus
Eu vou ler o post inteiro. Mas ainda nao rsrs. Volto já já pra me atualizar. Um abraço mano.
Inté!
Por sinal. Passei lá pela Luma e li a contribuiçao dela. Tá cheio de blogagens coletivas especiais este mês. Já viu o do Outubro Rosa? Também achei importantíssima, é incrível a quantidade de mulheres com câncer de mama. Uma coisa que se diagnosticada no início pode salvar vidas, de traumas e também da morte.
Bem, é isso. Voltarei.
“O Reino de Deus é ver sua criação livre de qualquer mal”
(Isaias 65.17-25, Oseias 2.19)
AMÉM!
- Pois é... em pleno século 21 e ainda existe persseguição em lugares como a Índia, e olha que lá até vaca eles adoram. "/
Eu li. Phodástico! Gostei mesmo. Esse texto já está me ajudando a desenvolver alguns conceitos, e é claro a amadurecer minha consciência a respeito da natureza.
Um dia quero ter um jardim.
Valeuzao.
Inté!
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